Ele não tinha muita habilidade, não fazia jogadas plásticas, muito menos dribles desconcertantes. Mas tinha raça e faro de gol, o que é muito importante para um centroavante.
Foi com estas e outras características que Gino Orlando alcançou o posto de segundo maior artilheiro da história do São Paulo, com 233 gols marcados.
Antes de virar atleta do Tricolor, chegou a atuar no Palmeiras entre 1950 e 1951, sem anotar um gol sequer nas quatro partidas que fez. Depois do Verdão, passou por clubes como XV de Jaú e o extinto Comercial Futebol Clube, ambos paulistas.
Chegou ao Morumbi em 1953, iniciando aí a história de amor com o São Paulo Futebol Clube. Atuou em outras equipes da cidade, como Juventus e Portuguesa, mas nunca escondeu a paixão que sentia pelo Tricolor.
Atuou também na seleção brasileira, pela qual fez nove partidas, com cinco vitórias, dois empates e duas derrotas, além de três gols marcados com a Amarelinha.
Jogador de feitos históricos, foi o primeiro a marcar um gol de bicicleta em Portugal, pela seleção, em 1957. Como dito anteriormente, ele mesmo se definia como um jogador “grosso”, um atacante trombador.
Quando percebia que o marcador não era de entrar em divididas, era ainda melhor. Seu ponto forte era o cabeceio, ainda mais por conta da altura. Conquistou dois títulos do Campeonato Paulista, em 1953 e 1957, pelo São Paulo.
Foi Gino Orlando quem inaugurou a trave do Morumbi, em 1960. Após sua aposentadoria, em 1969, tornou-se administrador do Estádio Cícero Pompeu de Toledo, cargo que ocupou até o dia de sua morte e que desempenhava com muito amor e carinho, tamanho era sua devoção pelo São Paulo.
Confira a entrevista que o Alambrado fez com o filho do ex-centroavante, Gino Orlando Júnior.
1 – Gino Orlando tinha boas recordações da época futebolística?
Gino: Tinha boas recordações, sim. Uma delas foi um gol de bicicleta marcado pela seleção brasileira em uma partida contra Portugal, sendo a mais bonita de sua carreira. Outra foi o sonho de ter jogado pela seleção brasileira e atuado ao lado de Pelé, Garrincha, Nilton Santos, Didi, grandes jogadores que passaram pela seleção.
2 – Ele tinha alguma mágoa?
Gino: Sim. Apesar de ser considerado campeão mundial de 1958, fizeram uma tremenda sacanagem política com ele. Meu pai era um dos melhores centroavantes da época, mas na convocação foram chamados Mazola e Vavá. Vavá era do Rio de Janeiro, um grande jogador, assim como Mazola. Mas a CBF, por ser do Rio, optou pelos atletas da cidade, inventando uma artrose em meu pai para que ele não fosse convocado.
3 – Após se aposentar, ele teve outra profissão, a de administrador do Morumbi. Como surgiu o convite?
Gino: Quando ele aposentou-se, foi trabalhar no Instituto Brasileiro do Café, como inspetor de café. Um dia um diretor do São Paulo, de cujo nome não me lembro, convidou-o para ser administrador do estádio do Morumbi. Meu pai trabalhou lá por 22 anos, dedicando-se de corpo e alma, indo todos os dias, inclusive em feriados, Até quando não precisava ele ia.
4 – Ele gostava realmente desse cargo?
Gino: Ele adorava. No início, não sabia absolutamente nada em termos de parte administrativa. Mas, por ser dedicado e por amar o São Paulo, aprendeu bastante e tornou-se um grande gerente, vindo a sair do cargo somente quando faleceu.
5 – Qual foi o maior evento que seu pai administrou no Morumbi?
Gino: Vários. A vinda do Papa ao Brasil, o show do cantor Michael Jackson e da banda Queen.
6 – Como ele era fora dos gramados? Conseguia ter um tempo para a família?
Gino: Meu pai tinha uma personalidade dentro dos gramados totalmente diferente da que tinha fora. Nos gramados, era raçudo. Não tinha técnica, mas era um ótimo finalizador, bravo e não levava desaforo para casa. Se fosse preciso, entrava mais forte.
Quando ele casou-se com minha mãe, diziam a ela que estava se casando com um homem violento e agressivo, mas estavam enganados. Fora dos campos, ele era tranquilo, calmo, um bom pai e um ótimo chefe de família.
7 – Até hoje ele é lembrado pelo São Paulo Futebol Clube?
Gino: Olha… Lembrado em termos. Se você for lá, ele será lembrado, mas o São Paulo não deu o devido reconhecimento que ele merecia. Pois meu pai atuou por lá durante 11 anos e, além disso, administrou o estádio por 22 anos. Eu acho que deveriam ter mais consideração após seu falecimento, consideração esta que ele só veio a ter no dia de sua morte, sendo deixado de lado após o ocorrido.
8 – Como é para você ser filho de um jogador tão importante como foi Gino Orlando?
Gino: Para mim é um orgulho, uma honra. É muito bom falar dele. Pois, além de ter sido um bom pai, foi um grande jogador. Não digo os jovens, mas os antigos sempre se lembram de meu pai. Aonde vou, as pessoas lembram, afinal levo seu nome. Ele deixou uma imagem muito boa, tanto quanto jogador como pessoa. Tenho muito a lhe agradecer, pois me deu tudo de que precisava.
9 – No futebol é comum serem construídas grandes amizades. Quem eram os amigos de seu pai?
Gino: Tinha o Dino Sani que foi um grande amigo do meu pai, o Pelé, que meu pai encontrava em qualquer lugar – eu mesmo fui ao estádio com meu pai e o conheci. O próprio Serginho Chulapa, esse mais recente, muito amigo dele. Mas meu pai identificou-se mesmo foi com Dino Sani.
10 – Você é são-paulino? Caso não seja, o que o fez torcer por outro time?
Gino: Eu não sou são-paulino. Eu nasci no ano em que o São Paulo foi campeão paulista, em 1957, quando o Tricolor derrotou o Corinthians, meu time de coração. Eu tenho até uma foto no colo de meu pai com a faixa de campeão paulista, mas sou corintiano.
Isso se deve a Roberto Rivellino, um grande jogador e meu ídolo. Não quer dizer que eu não goste do São Paulo. Tenho um carinho pelo clube, pois lá pude jogar ao lado de Muricy Ramalho, Coronesi, que foram grandes jogadores na época.
11 – Existe uma história sobre uma briga entre Luizinho, o Pequeno Polegar, e Gino Orlando, mas esse caso nunca foi bem esclarecido. O que você poderia dizer sobre o assunto?
Gino: Foi o seguinte: Luizinho era um craque do futebol, muito técnico, e toda vez que o São Paulo jogava contra o Corinthians, meu pai o atormentava. Chegava e dizia “o seu irmão é bicha”, que, de fato, era homossexual, o que fazia com Luizinho ficasse muito bravo. Só que ele, como possuía uma baixa estatura, não conseguiria fazer nada contra meu pai, que era alto e forte.
Um dia, meu pai foi visitar Alfredo Ramos, que havia se machucado durante uma partida, e Luizinho também estava lá. Acabou que o Pequeno Polegar pegou um tijolo e atacou o meu pai e machucou sua testa. Meu pai o provocava para enervá-lo e desconcentrá-lo. No fim, eles fizeram as pazes, tornando-se grandes amigos. Cada um seguiu seu caminho.
12 – Por que você não seguiu os passos de seu pai?
Gino: Eu gostaria muito de ter jogado. Tive a oportunidade de treinar no São Paulo, tinha tudo para dar certo, mas meu pai não deixou. Porque na época não se ganhava o tanto de dinheiro que hoje os jogadores ganham, tanto que, se hoje meu pai jogasse, estaria milionário. Apesar de não ser um craque, fazia muitos gols.
Ele preferiu que eu fosse estudar, pois assim teria um futuro melhor. Tive a oportunidade de jogar uma preliminar entre São Paulo e Corinthians pelo Tricolor e fiz um gol, o gol da vitória. No dia seguinte me levaram um contrato, mas meu pai não deixou. Para não contrariá-lo, aceitei e hoje sou engenheiro e administrador de empresas.