Em comparações com outros torneios nacionais ao redor do mundo, costuma-se dizer que o Campeonato Brasileiro tem um charme diferente. Afinal, enquanto em países como Espanha a disputa pelo título tende a ficar restrita entre apenas duas ou três equipes, no Brasil a temporada começa imprevisível, com pelo menos 12 grandes clubes em condições de levantar a taça. Ao menos teoricamente.
Sim, o país tem um grande número de clubes tradicionais, que não chegariam a surpreender em caso de título. Mas nos últimos anos, uma análise das classificações finais de cada Brasileirão mostra uma tendência a ser estudada. Os mesmos times têm ocupado o topo da tabela com certa frequência. Parece ser mais difícil entrar no clubinho privado da elite do nosso futebol.
É possível apontar diversas razões para essa mudança, sendo que uma delas é a alteração do formato da competição. Nas últimas 13 edições, desde que os pontos corridos foram adotados, apenas seis equipes conquistaram o troféu. Considerando o mesmo período nos últimos 13 anos da era mata-mata, foram nove campeões diferentes.
Mais que isso, os candidatos ao título parecem estar cada vez mais presos à região Sudeste. Como já foi mostrado no Alambrado, a região domina o Campeonato Brasileiro desde 2001, quando o Atlético-PR ficou com a taça.
A discussão é ampla e polêmica, portanto merece que algumas questões sejam abordadas. A primeira: de fato, o formato de pontos corridos parece ser o mais justo, por premiar a regularidade de uma equipe durante a competição e fazer com que eventuais prejuízos à legitimidade dos jogos (como erros de arbitragem) possam ser minimizados durante a disputa. O torneio é muito mais organizado dessa forma, evitando regulamentos bizarros que eram elaborados com frequência na época do mata-mata.
Olhando friamente, não há o que reclamar desse modelo. O melhor time ganha, ou pelo menos o mais competente, certo? Quem se organiza e trabalha com inteligência vê suas chances de conquista aumentarem muito.
Mas há um outro ponto importante na discussão, e é aí que mora uma contradição na justiça desse sistema. Porque é difícil acreditar em meritocracia em uma corrida onde um atleta corre com os melhores acessórios e o outro vai descalço.
Traduzindo: organizar-se com uma verba maior é muito mais fácil. Clubes do Sudeste, especialmente os do eixo Rio-São Paulo, costumam ter suas marcas expostas com muito mais frequência que seus rivais de outras regiões. Com mais exposição, arrecadam mais em patrocínio. E ainda soma-se a isso a incrível disparidade nos valores pagos pela TV.
Flamengo e Corinthians receberão, cada um, cerca de 170 milhões pelos direitos de transmissão até 2018. Um montante que permite montar times competitivos mesmo com alguns deslizes na administração (vide Alexandre Pato). Já o Sport, que conquistou um honroso sexto lugar em 2015, receberá “apenas” 35 milhões, quase 20% do valor dos líderes.
Será, portanto, que o sistema de pontos corridos pode ser considerado justo em um contexto de desigualdade de condições entre times do mesmo campeonato? E será que voltar ao mata-mata não daria a esses times de outras regiões uma chance maior de entrar com força na briga por títulos?
São questões polêmicas. Afinal, na Copa do Brasil, um torneio eliminatório, o domínio dos clubes mais abastados também é considerável, sendo que o último título de uma equipe fora da região foi em 2008 (coincidentemente, com o Sport).
Parece um tanto radical jogar a culpa dessa centralização nos pontos corridos. É possível, sim, fazer um campeonato nesses moldes abrangendo um contingente alto de competidores de alto nível. Basta fornecer condições que, senão iguais, sejam ao menos semelhantes para todos. E deixar que o mérito de cada um seja mais aplicado em campo que no caixa.