Estava calor em mais uma tarde de eterno verão em Ribeirão Preto. Fato mais do que comum na cidade que é apelidada de a “Califórnia Brasileira”. No último sábado (18), uma partida movimentou a metade alvinegra da cidade do interior paulista. A 17º rodada do Campeonato Paulista da série A-2 colocou frente a frente dois ameaçados pelo rebaixamento: Comercial e Velo Clube.
O local da peleja era desconhecido para mim. O tradicional Palma Travassos já foi palco de inúmeros jogos históricos, principalmente nas décadas de 60 e 70, época em que o Bafo fazia os alvinegros comemorarem mais do que sofrerem.
Chegando ao estádio, localizado no Jardim Paulista e próximo à minirrodoviária da cidade, logo percebi uma movimentação relativamente grande de torcedores. A pequena fila nas bilheterias era fruto de uma promoção da diretoria. Ingressos que variavam de R$ 5 a R$ 15 reais. Tal ação visava a melhoria na média de público. Até a 17ª rodada, pouco mais de 800 torcedores foram, em média, às partidas do Comercial.
E não é que deu certo? Nesta partida o público foi de 1.450 pessoas, o segundo maior no ano. A apaixonada torcida comercialina é conhecida por ser muito fiel e sofredora. Aí é que aparece o “Seu Caetano”, 58, personagem simpático e torcedor fanático do Bafo. “Dizem que torcida sofredora é do Corinthians, mas é por que não conhecem a do Comercial”, disse.
A conversa de boa qualidade e que gerou muito conhecimento aconteceu em um dos lugares mais bacanas do estádio da Joia do Jardim Paulista. Atrás de um dos gols e em meio a um descampado característico do local, vários torcedores acompanhavam a partida, literalmente, no alambrado. A peculiaridade é vista também no alambrado lateral.
“É a F.O.D.A, Força Organizada do Alambrado. Torcida que sempre fica aqui”, brinca Seu Caetano, com o fato de ter tantos torcedores acompanhando o jogo por ali. Realmente, tal característica tão tradicional em um estádio antigo contrastava com o cenário moderno em que o estádio está localizado. Em meio a prédios, o Palma Travassos ainda possui alguma essência do futebol mais simplório.
Foi atrás do alambrado e ao lado de Caetano e seu filho Gleyson Fernando, 18, que acompanhei todo o longo primeiro tempo. A cada passe errado da fraca, mas esforçada equipe do Comercial, ouvia-se um lamento, quase uma súplica, por algum tipo de talento que a equipe já ostentou em suas fileiras há muitos anos.
Mateus Borges, camisa 10 e craque do time, é o oásis de uma equipe muito limitada tecnicamente. Apesar da forma física um pouco aquém, Mateus é aquele jogador que dita o ritmo e cria situações de perigo.
Ao lado dele, milita o experiente Marcinho Beija-Flor. Conhecido por todo o interior, é o ídolo de uma torcia exigente. Aos 35 anos, ele fez o gol do Comercial aos 13 minutos do primeiro tempo e causou loucura nas arquibancadas e no alambrado do estádio Palma Travassos.
Caetano e Gleyson se abraçaram muito. Era nítida a paixão de ambos pelo Comercial. “Viajo com o time pelo interior. Sou torcedor fanático do time”, disse Gleyson. Duas gerações que alimentam um amor gigante pelo time alvinegro.
O pai, há mais de 40 anos acompanhando o time, sentencia que Píter, Carlos César e Jair Bala são seus maiores ídolos no Bafo. Já o filho lembra-se de Raphael Macena e do goleiro Alex, heróis de acessos recentes. Apesar de terem vivenciado épocas diferentes, a rivalidade com o Botafogo continua gigantesca e é unanimidade.
Após a primeira etapa, os dois rumaram para outro setor do estádio para continuar torcendo pelo Comercial. Não sei como reagiram ao fim do jogo. No segundo tempo, a tensão aumentou. Apesar da vantagem no placar e de possuir um jogador a mais durante quase toda a etapa, o Bafo sofreu muito.
Após muitos chutões, apoio da torcida e até um “pior Comercial da história”, a torcida explodiu com o apito final. A pressão do alambrado era impressionante. Um clima magnifico e que promovia intimidade entre os torcedores. A importância daqueles quase 1500 torcedores foi incomensurável.
Sem eles, provavelmente o Comercial não ganharia o jogo dos desesperados. Agora, o clube precisa de uma vitória nas últimas duas rodadas que deve livrá-lo do descenso. A equipe encontra-se na 14º colocação e continua ameaçada pelo rebaixamento.
Sorte que no último jogo os jogadores poderão contar com o apoio da fanática e fiel torcida. A mística do alambrado estará presente e pai e filho vão apoiar o time amado em busca de evitar um dos capítulos mais tristes na história do Comercial.