Depois de uma frustrada passagem pela equipe nacional de seu país, o técnico argentino Jorge Sampaoli, 58 anos, chega ao Brasil para comandar o Santos e resgatar o prestígio obtido em seu dias de Universidad de Chile (de 2011 a 2012) e de seleção chilena (de 2012 a 2016). Antes da fama global, porém, ele já gozava de relativo destaque – e não me refiro aqui ao episódio no qual subiu numa árvore para orientar seus jogadores.
A propósito, o fato ocorreu em 1996, quando ele trabalhava nas ligas regionais do interior argentino e encontrou um modo inusitado de driblar os efeitos de sua expulsão. Enfim. Bem-sucedido nas categorias aludidas, Sampaoli ganhou sua primeira chance na elite ao ser contratado pelo Juan Aurich, do Peru, em 2002. Já em meados daquele ano, transferiu-se para o Sport Boys, e lá escreveu um capítulo interessante de sua trajetória.
Naquela altura, os “Rosados” viviam boa fase. Entre idas e vindas de técnicos, em especial as de Cézar Gonzales e Ramón Mifflin, conseguiam brigar na parte de cima da tabela e haviam disputado uma Copa Conmebol recentemente, além de terem jogado uma Libertadores no ano anterior à chegada de Sampaoli. O comandante argentino, aproveitando alguma base e aplicando sua filosofia, manteve essa condição até 2003.
Porém, em meio à crise financeira dos clubes peruanos, os jogadores deflagraram uma greve geral na reta final do Clausura. Aliada ao desarranjos da federação nacional (FPF), a paralisação minou o sonho continental do Sport Boys. A sete rodadas do fim, motivados por dívidas, os futebolistas se negaram a atuar. Por sua vez, a FPF ignorou o protesto e organizou a maioria dos jogos das duas rodadas seguintes com times sub-20.
Perdendo a queda de braço, que forçou os clubes a adotarem medidas mais rígidas para honrar seus compromissos trabalhistas, a entidade reguladora do futebol peruano anulou os jogos disputados pelos atletas da base e encerrou o torneio na 15ª rodada.
Assim, não houve rebaixamentos e o Alianza Lima foi o campeão. Só que os problemas não acabaram por aí. Havia ainda a necessidade de definir a terceira vaga do país na Libertadores de 2004.
Pelos resultados até a 15ª rodada, o posto seria do Coronel Bolognesi (60 pontos), terceiro colocado na soma da pontuação do Apertura e do Clausura, à frente de Sport Boys (58), Alianza Atlético (58) e Unión Haral (50). Já o Sport Boys, em sua defesa, contabilizava os resultados obtidos com o sub-20, que deixaria a tabela da seguinte forma: Sport Boys (64), Alianza Atlético (61), Coronel Bolognesi (60) e Unión Huaral (54).
No entanto, a FPF rechaçou essa possibilidade e anunciou que a vaga seria definida através de um quadrangular, para o qual houve uma série de desempate entre dois times que não estavam empatados: Unión Huaral e Cienciano – este era o sétimo na tabela anual (mas crescia na Sul-Americana, da qual seria o campeão). Enquanto isso, o Sport Boys se recusou a aceitar essa fórmula, tornando-a um “quadrangular” de três.
Presidente dos Rosados à época, Miguel Monteverde fez uma declaração incisiva. “O Sport Boys não se apresentará no torneio nem com o sub-18, nem com camisas pretas (como forma protesto). Simplesmente não participará de algo que considera totalmente injusto. Aqui o único que perderam com tudo isso fomos nós”, garantiu. E eles não voltaram atrás, deixando escapar assim a chance de jogarem sua última Libertadores.
No fim das contas, quem levou a vaga foi o Cienciano, ao passo que Sampaoli deixou o cargo para assumir o Coronel Bolognesi na temporada seguinte. Por um lado, o Sport Boys perdeu espaço nacionalmente e foi rebaixado duas vezes desde então. Por outro, o treinador cresceu e amealhou títulos importantes. Apesar das trajetórias distintas, ambos sofreram com a má fase em 2018 e agora buscam novos horizontes nesse ciclo.