Quando o carrinho vale por um gol

Quando o carrinho vale por um gol

Carrinhos nem sempre são recursos negativos e também demonstram a garra de seus protagonistas

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O carrinho, esse recurso por vezes tão demonizado, certamente não proporciona aos torcedores o mesmo êxtase do gol. Mas há situações em que o simples ato de deslizar pelo gramado para desarmar o oponente pode ser tão importante quanto a bola na rede.

Em geral, a função de bloquear o ímpeto ofensivo do rival com o próprio corpo cabe aos jogadores desprovidos de técnicas apuradas, aos homens de marcação que não temem a sujeira em seus uniformes nem as possíveis consequências de um choque físico.

E é justamente a coragem e a determinação que os tornam ídolos, sendo que seus fãs fazem questão de exaltá-los a cada tentativa de evitar um escanteio, com gritos de “beeem!”, e lhes dão apelidos bastante interessantes, como “Deus da raça”.

Foi o que ocorreu com Javier Mascherano na Copa do Mundo de 2014, quando muitos argentinos o elegeram como símbolo da seleção devido ao empenho e à entrega que o jogador apresentou em campo, principalmente na semifinal contra a Holanda.

Em Itaquera, naquele 9 de julho, “El Jefecito” fez uma partida invejável. Mas poderia ter sido diferente. Aos 25 minutos do primeiro tempo, ele bateu a cabeça em Georginio Wijnaldum durante uma disputa de bola no alto e caiu no gramado, atordoado.

Antes de ir ao chão, o volante tentou bravamente permanecer em pé, e conseguiu fazê-lo durante alguns segundos, mas não encontrou forças suficientes e desabou, preocupando o técnico Alejandro Sabella e até mesmo Lionel Messi, que às vezes parece estar distante.

Apesar de ter se recuperado e voltado ao jogo, essa não foi a cena mais marcante de Mascherano. Aos 45 minutos do segundo tempo, Arjen Robben recebeu uma bola em frente à grande área, driblou um zagueiro e seguiu em diagonal para a esquerda.

O holandês chegou ao bico da pequena área com o chute de canhota preparadíssimo, e o gol, àquela altura, representaria a sonhada classificação. A façanha, porém, foi impedida por um carrinho milagroso de Javier, que depois revelou ter “rasgado o ânus” na jogada.

Este é só um exemplo recente de quando um carrinho possui o mesmo valor de um gol. Às vezes, atirar-se com as pernas projetadas em direção à pelota não tem a mesma importância, mas nem por isso deixa de ser um ato admirável – quando leal, é claro.

Há ocasiões, vale ressaltar, que os pés não dão conta do serviço sujo. Então, o jogador usa o que lhe vem à cabeça. Ou a própria cabeça, como fez o uruguaio Nicolás Lodeiro para deter o inglês Wayne Rooney, relembrando outra vez o Mundial no Brasil.

Particularmente, prefiro o caso do argentino Gaspar Iñíguez, hoje emprestado pelo Granada-ESP ao Carpi-ITA. Em 2013, quando defendia o Argentinos Juniors, ele lançou-se de cabeça contra os pés do boquense Cristian Erbes aos 43 minutos da etapa final.

Devido aos seus esforços impressionantes, o volante perdeu três dentes na pancada. Valeu a pena? Bem, o Argentinos segurou o empate sem gols diante do Boca Juniors, e Iñíguez ganhou status de herói. Arrependimento? Antes de ser submetido a um tratamento odontológico, ele assegurou que repetiria o lance, dependendo da partida. Haja coragem!

Além de demonstrar raça, quando bem aplicada, essa inestimável técnica representa também toda a dedicação de um jogador em defender o gol, seu grande patrimônio.

Enfim, os carrinhos, repito, não costumam ter o mesmo valor de uma bola na rede. Todavia, em certas ocasiões podem arrancar do torcedor uma comemoração ou um alívio de igual intensidade, mesmo que custem alguns dentes aos seus protagonistas.

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Jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero, é apreciador do futebol latino, do teor político-social do esporte bretão e também de seu lado histórico.