Copa América: o primeiro grande título do Brasil

Copa América: o primeiro grande título do Brasil

Relembre a conquista do torneio sul-americano realizado em 1919, no Rio de Janeiro

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Depois da extinção do British Home Championship, no Reino Unido, em 1984, a Copa América herdou o título de torneio entre seleções mais antigo do mundo. Sua primeira edição foi realizada em 1916, na Argentina, com o nome de Campeonato Sul-Americano de Futebol, e teve o Uruguai como grande vencedor. O selecionado anfitrião terminou no segundo lugar, seguido por Brasil e Chile, respectivamente.

A classificação repetiu-se em 1917, no Uruguai, um ano após as confederações dos quatro países fundarem a CONMEBOL. O Rio de Janeiro seria a sede do ano seguinte, mas a pandemia de gripe espanhola fez a competição ser adiada para 1919. Em termos de relevância, é nesta temporada que começa a grandiosa história da Seleção brasileira.

CONTEXTO

Primeiro, recordemos o contexto histórico da capital do país. Em maio daquele ano, o presidente era Delfim Moreira, vice de Rodrigues Alves, porque este havia sido vítima da gripe citada e faleceu antes de tomar posse. O Partido Republicano Paulista (PRP) e o Partido Republicano Mineiro (PRM) se revezavam no poder da República Velha, com a aliança que ficou conhecida como política do “café com leite”.

No Rio de Janeiro, a população ainda sofria com os efeitos da doença que também atingiu outras partes do território nacional, como as cidades de Recife e Salvador, por exemplo. Em dois meses, mais de 12 mil pessoas perderam a vida na capital em função da virulência. Estima-se que houve 300 mil mortes no país, cuja população era superior a 30 milhões de habitantes em 1920, de acordo com o censo demográfico da época.

No futebol de São Paulo, destacavam-se as equipes do Paulistano, Palestra Itália, Corinthians e Santos, além de times como Mackenzie e Ypiranga. No Rio, por sua vez, Fluminense, Botafogo, Flamengo, São Cristóvão e América eram os clubes que se sobressaíam. Por curiosidade, vale lembrar que a Confederação Brasileira de Desportos (CDB) só reconheceu oficialmente o regime profissional do esporte em 1937.

Bem antes, em 1914, o Brasil conquistava seu primeiro título. A Seleção nacional derrotou a Argentina por 1 a 0, em Buenos Aires, e faturou a Copa Roca, competição amistosa disputada entre os dois países. Atualmente, o torneio é chamado de Superclássico das Américas. Porém, como já explicado no título, a antiga Copa América foi de fato a primeiro taça de grande expressão do Brasil.

Taça Copa América (Foto: Divulgação)
Brasil é hoje o terceiro maior vencedor da Copa América, com oito títulos (Foto: Divulgação)

Como não havia um técnico propriamente dito, as convocações e os treinamentos eram realizados por uma comissão denominada de “Ground Comitteé”, enquanto a função de técnico era destinada ao capitão do time. Para abrigar o certame, foi construído o Estádio das Laranjeiras, propriedade do Fluminense, com capacidade para 18 mil espectadores bem acomodados.

A CAMPANHA

Na época, a Seleção brasileira jogava de camisa branca e calção azul (o amarelo seria integrado de vez ao uniforme principal em 1954, embora o branco tenha sido usado em algumas partidas após a derrota na final da Copa do Mundo de 1950). A estreia ocorreu diante do Chile, em 11 de maio, e foi irrepreensível: 6 a 0.

O massacre começou com o lendário Friedenreich, que anotou o primeiro gol aos 19 minutos e o terceiro aos 38 da primeira etapa. Aos 21, Neco converteu o segundo. Na última etapa, Friedenreich voltou a incomodar o adversário e ampliou aos 31, pouco antes Haroldo marcar o quinto. Coube a Neco dar números finais ao confronto.

Em 13 de maio, o bicampeão Uruguai sofreu para vencer a Argentina. Apesar de ter aberto dois gols de vantagem aos 23 minutos, com os irmãos Carlos e Héctor Scarone, a Celeste Olímpica cedeu o empate a quase 10 minutos do término da partida. Mas Isabelino Gradín, artilheiro em 1916, decretou o triunfo por 3 a 2.

Na rodada seguinte, o Uruguai derrotou o Chile por 2 a 0, com tentos de Carlos Scarone e José Pérez. No outro jogo, o Brasil bateu a Argentina por 3 a 1, gols de Heitor Domingues, Amílcar e Millon. Aguirre descontou quando os visitantes perdiam por 2 a 0.

Com os resultados, Brasil e Uruguai estavam invictos. No confronto direto, em 26 de maio, a Celeste saiu na frente com dois gols antes dos 20 minutos (Gradín e Scarone). Contudo, Neco teve boa atuação e marcou duas vezes para os donos da casa, igualando o placar depois do intervalo: 2 a 2.

Escrete brasileiro no Estádio das Laranjeiras antes da final contra o Uruguai (Foto: Reprodução)
Escrete brasileiro de branco, no Estádio das Laranjeiras, antes da final contra o Uruguai (Foto: Reprodução)

Como as duas seleções permaneciam empatadas em número de pontos, houve a necessidade de realizar um jogo extra para definir o ganhador. Antes disso, em 22 de maio, Argentina e Chile se enfrentaram em busca da primeira vitória. Destaque, o argentino Edwin Clarcke balançou as redes três na goleada por 4 a 1.

Em 29 de maio, aconteceu a acirrada disputa pelo título. Ambas as equipes protagonizaram um duelo parelho diante de quase 28 mil torcedores, segundo indicam registros. No histórico do encontro, o Uruguai tinha vantagem de duas vitórias (2 a 1, em 1916, e 4 a 0, em 1917) e um empate.

Por isso, de certa forma, havia um clima de revanche por parte dos brasileiros. Mas esse fator não foi o suficiente para decidir no tempo regulamentar. Com a igualdade, foram necessárias duas prorrogações de 30 minutos para definir o novo campeão do torneio.

Então, a estrela de Friedenreich brilhou. O atacante, no início da segunda prorrogação, colocou os brasileiros em vantagem. A equipe da casa superou o cansaço e impediu o tricampeonato uruguaio no jogo mais longo da história da competição.

Com quatro gols, Friedenreich foi artilheiro ao lado do compatriota Neco (Foto: Reprodução)

Herói após 150 minutos, El Tigre, apelido que lhe fora dado pelos uruguaios, igualou-se a Neco na artilharia, com quatro gols. Além disso, seu feito inspirou o ilustre dueto formado por Pixinguinha e Benedito Lacerda, que compuseram o choro “Um a Zero”.

No fim, o Brasil teve o melhor ataque (12 gols) e a melhor defesa (3 gols). O Chile, por outro lado, apresentou o pior setor ofensivo (1 gol) e defensivo (12 gols). Argentina e Uruguai fizeram 7 gols cada, porém o Uruguai sofreu dois a menos (5).

Veja as escalações da partida decisiva no Rio de Janeiro:

BRASIL: Marcos de Mendonça (Fluminense-RJ), Píndaro (Flamengo-RJ) e Bianco (Palestra Itália-SP); Sergio Pires (Paulistano-SP), Amílcar (Corinthians-SP) e Fortes (Fluminense-RJ); Millon (Santos-SP), Neco (Corinthians-SP), Friedenreich (Paulistano-SP), Heitor (Palestra Itália-SP) e Arnaldo (Santos-SP).
Técnico: Haroldo Domingues (em alguns registros, consta como Ground Committeé).

URUGUAI: Cayetano Saporiti, Manuel Varela e Alfredo Foglino; Rogelio Naguil, Alfredo Zibechi e José Vanzzino; José Pérez, Héctor Scarone, Ángel Romano, Isabelino Gradín e Rodolfo Marán.
Técnico: Severino Castillo.

INÍCIO DE UM GRANDE FUTURO

A partir de então, o Brasil ganhou mais sete vezes o campeonato (em 1922 e 1949, ainda com o nome de Sul-Americano, e 1989, 1997, 1999, 2004 e 2007, já com o nome de Copa América). É o terceiro maior vencedor, atrás de Uruguai (15) e Argentina (14).

Hoje, além dos quatro países fundadores, também competem Bolívia, Paraguai, Colômbia, Peru e Equador e Venezuela, filiados à CONMEBOL. Desde 1993, duas seleções de outras confederações são convidadas para a disputa. É o caso de México e Jamaica em 2015.

Após tantas mudanças, é importante lembrar os primeiros passos que o Brasil deu para construir uma das trajetórias mais bem sucedidas da história do futebol, ainda que esta, infelizmente, tenha sido manchada pela indelével derrota por 7 a 1 diante da Alemanha.

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