Destemida e apaixonada, espanhola driblou preconceitos para fundar seu clube

Destemida e apaixonada, espanhola driblou preconceitos para fundar seu clube

Numa época em que as mulheres eram impedidas de fazer várias coisas, Amelia del Castillo quebrou barreiras

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Amelia del Castillo
Com 22 anos, Amelia presidia e treinava o Atlético de Pinto (Foto: Reprodução)

De tempos em tempos, surge alguém responsável por evidenciar preconceitos há muito enraizados na sociedade e que, a partir de questionamentos sobre antigos paradigmas, tenta quebrar essas barreiras para alterar o modelo vigente. Quem consegue superá-lo, transforma-se em ícone e é tido como referência para aqueles que desejam trilhar o mesmo caminho, antes virtualmente intransponível. É o caso de Amelia del Castillo.

Apaixonada pelo esporte bretão e fã do Atlético de Madrid, a espanhola, à base de muito esforço e determinação, deixou para trás inúmeros obstáculos até concretizar seu sonho, que se tornou realidade em 15 de outubro de 1963, com a fundação do Atlético de Pinto, no município homônimo, situado aproximadamente 20 km ao sul da capital do país. Dessa maneira, ela tornou-se a primeira mulher a presidir um clube de futebol na Espanha.

Vale destacar aqui alguns pontos referentes ao contexto no qual as mulheres estavam inseridas na época da ditadura franquista. Embora a década mencionada tenha sido importante em virtude da forte transformação socioeconômica e cultural no que diz respeito a conquistas do movimento feminista, ainda havia muitas desigualdades.

Se por um lado foram promovidas reformas para a incorporação feminina à vida laboral fora do ambiente doméstico (só para as esposas) e a permissão para ocupar determinados cargos públicos, por outro persistia a impossibilidade de assinar contrato de trabalho, dirigir, abrir conta bancária sem a autorização do marido e até divorciar-se.

Logo, aventurar-se no futebol, um ambiente historicamente tido como só para homens, foi um notável ato de bravura da jovem Castillo, à época com 22 anos. Além de fundar o clube por conta própria, com a promessa de que os jovens locais pudessem ter uma equipe, ela o inscreveu em torneios e, polivalente, desempenhou o papel de treinadora.

Como se não bastasse todo o empenho voltado à administração do clube, Amelia buscou apoio econômico para levar adiante seu projeto incipiente. Na capital, uma pessoa em especial prestou-lhe valoroso auxílio nesses tempos difíceis: ninguém menos que Vicente Calderón, então presidente colchonero, que forneceu bolas, uniformes e até comprou todos os números da rifa de uma câmera fotográfica para ajudar financeiramente.

Naquele momento, Castillo decidiu que o representante de Pinto deveria levar em seu nome a palavra Atlético. E, em 1963, o clube foi inscrito na federação do país. Depois, Real Madrid e Rayo Vallecano também abraçaram a nova celebridade do futebol, que sofreu com inúmeras ofensas sexistas. “Me diziam de tudo, eu tinha que passar não por muitas barreiras, mas por todas elas, e só encontrei carinho e respeito em todo o futebol madrilenho”, sublinhou em antiga entrevista ao Mundo Deportivo.

Já em 1975, com o clube estabilizado, a presidenta viu-se obrigada a deixar o cargo, desgastada por conflitos políticos que ameaçavam inclusive a sobrevivência do Atlético de Pinto. Seu campo estava começando a ser reformado, mas o prefeito da época, ao ver que a instituição ganhava sócios e força, decidiu prejudicá-la e advertiu que criaria um time paralelo para asfixiar o Atlético. Desse modo, ela preferiu renunciar.

Em 2000, o Atlético recompensou em forma de homenagem todos os sacrifícios feitos por Amelia del Castillo, emprestando o nome da antiga mandatária ao estádio. “Foi uma grande felicidade. Estou muito agradecida e isso me enche de orgulho”, explicou. Hoje, o clube do qual ela é presidenta de honra disputa a quarta categoria do futebol espanhol. Uma história de uma verdadeira lutadora apaixonada que nunca deixou de sonhar.

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