2004: A ascensão do Império de Adriano

2004: A ascensão do Império de Adriano

Com time "reserva", Brasil foi campeão da Copa América em 2004 em cima do maior rival

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Adriano comemora o gol que escreveu seu nome na história da Copa América (Foto: Conmebol/Divulgação)
Adriano comemora o gol que escreveu seu nome na história da Copa América (Foto: Reprodução/Twitter)

Amantes da seleção brasileira costumam dizer que ganhar é bom, mas ganhar da Argentina é melhor ainda. Compreensível, considerando a histórica rivalidade futebolística entre os dois vizinhos sul-americanos. Se uma vitória qualquer contra os argentinos já tem um peso maior que o normal, o que dizer de um triunfo em final de campeonato, jogando com um time praticamente reserva e com um gol salvador nos acréscimos do segundo tempo?

A combinação parece improvável, mas aconteceu na Copa América de 2004, no Peru. Por conta de lesões e, em alguns casos, pedidos de clubes europeus para terrem seus atletas poupados, o técnico Carlos Alberto Parreira convocou para a disputa do torneio continental uma seleção alternativa, com muitas novidades em relação ao time que havia sido campeão mundial dois anos antes.

Sem Ronaldo, Ronaldinho, Kaká, Cafu, Dida e Roberto Carlos, entre outros, a chance de brilhar aparecia para os novatos Julio César, Maicon, Dudu Cearense, Renato, Diego, Vágner Love e, principalmente, Adriano, que começava a se destacar no futebol italiano. O único pentacampeão da lista era o volante Kléberson, que na época atuava no Manchester United.

Desde o início, parecia claro que a competição serviria para dar tempo de jogo a alguns atletas e permitir que entendessem como é atuar pela seleção. As atenções gerais estavam mais voltadas à seleção argentina, que depois de anos colocando a Copa América em segundo plano voltava a participar do torneio com força total.

O interesse pelo desempenho do Brasil diminuiu ainda mais depois da fraca estreia contra o Chile, em Arequipa. Os chilenos chegaram a desperdiçar um pênalti quando o jogo ainda estava 0x0. Nos minutos finais, Luis Fabiano decidiu a partida, subindo mais alto que a defesa em uma cobrança de escanteio e cabeceando para o gol.

No segundo jogo, contra a Costa Rica, uma atuação tranquila, com a adição de um Adriano inspirado, trouxe a vitória e a classificação para a segunda fase. O Imperador marcou três gols, e o zagueiro Juan também deixou sua marca. Os costarriquenhos ainda descontaram com Marín, fechando o placar em 4×1.

Na última rodada da primeira fase, um susto. Ainda sob ajustes, o time comandado por Parreira sucumbiu à organização do bom time do Paraguai. González abriu o placar para os paraguaios e, logo depois, Luis Fabiano empatou. Aos 26 do segundo tempo, Bareiro aproveitou uma falha da marcação para tocar na saída de Júlio César e selar a vitória da seleção guarani.

Foi somente nas quartas de final que o Brasil realmente conseguiu mostrar seu poder de fogo contra um adversário qualificado. O México, costumeiramente uma asa negra da seleção canarinho, não foi páreo em mais uma noite inspirada de Adriano, que marcou dois gols. O meia Alex, craque do Brasileiro anterior, também deixou sua marca, e Ricardo Oliveira completou o 4×0 que finalmente empolgou a torcida.

Um clássico nas semifinais definiria o futuro brasileiro na competição. O adversário seria o Uruguai, que vinha de uma campanha vacilante e com vitórias conseguidas a fórceps, bem a seu estilo. O clima tenso permeou a partida desde o início, e a pressão só aumentou depois que Sosa abriu o placar para a Celeste, aos 22 minutos, em falha de Júlio César. Logo no início do segundo tempo, Adriano empatou a partida, o que deixou o jogo ainda mais imprevisível e cheio de alternativas.

Mesmo após várias chances desperdiçadas de lado a lado, a partida terminaria com o empate em 1×1. Pela primeira vez naquela edição da Copa América, uma vaga seria decidida nos pênaltis. E nos tiros da marca da cal, o Brasil jogou longe a pressão, convertendo todas as cobranças. Julio César teve a chance de se redimir do frango, e conseguiu, defendendo o chute de Sánchez e colocando o Brasil na final.

Chegava a hora do duelo que foi adiado por tanto tempo. Brasil e Argentina já haviam decidido títulos antes, mas nunca em uma legítima final de campeonato. Os argentinos haviam cumprido seu destacado favoritismo até então, passando sem grandes sustos pelo Peru nas quartas e pela Colômbia nas semis. Em entrevistas pré-jogo, o clima na seleção brasileira era de descontração, com vários jogadores apontando que iriam “se divertir” em campo.

Mas o clima pesado de uma finalíssima não parece ser o mais apropriado para diversões. O Brasil sentiria isso na pele logo desde o início, com uma blitz argentina que resultaria em um pênalti de Maicon sobre Lucho González, após boa tabela com Tevez. Na cobrança, Kily González colocou os hermanos na frente, aos 21 minutos.

O gol não acomodou os argentinos, que continuaram em cima tentando aumentar a vantagem. Mas quem comemoraria seria o lado verde e amarelo. Após bela batida de falta de Alex, o zagueiro Luisão cabeceou com força para o chão. A bola morreu no canto do goleiro Abbodanzieri, que nada pôde fazer.

Daí em diante, mais pressão da Argentina, que amassava o Brasil em seu campo de defesa. Parecia inevitável o gol de desempate. E foi. Depois de muita resistência, a retranca brasileira finalmente foi superada, aos 42 minutos, com um belo chute de Delgado. Pelas escalações e pelo tempo de jogo a correr, parecia que o título estava encaminhado para a albiceleste.

Tantos elementos a favor fizeram com que os argentinos acreditassem no lema dos brasileiros antes do jogo. Resolveram se divertir em campo, esperando o tempo passar até o apito final. Já nos acréscimos, Tevez puxou a bola até a bandeira de escanteio e começou a passar o pé, provocando os atletas adversários. Maicon não caiu na provocação, e o Brasil acabaria recuperando a bola.

O lance pareceu ter ativado alguma engrenagem no brio dos jogadores brasileiros. Correndo contra o relógio, a ordem era mandar a redonda para a frente e torcer para que a dupla de atacantes altos pudesse fazer a diferença. E o resultado não poderia ter sido melhor. Após confusão na área, Luis Fabiano brigou com a defesa argentina e conseguiu fazer com que a bola sobrasse no pé de Adriano. O menino da Vila Cruzeiro dominou com um toque para o alto, e mandou um chutaço empurrado por 180 milhões de compatriotas. A bomba morreu no canto de um impotente Abbondanzieri. Era o gol do empate e da consagração do Imperador como artilheiro da Copa América, com sete gols. Mas muito mais que isso.

Os argentinos ficaram destruídos emocionalmente pelo título deslizando de suas mãos nos últimos instantes. Pela primeira vez, o favoritismo passava todo para o lado do Brasil, que não se fez de revogado e aproveitou o efeito psicológico do chute espírita de Adriano. Pela segunda vez seguida, os brasileiros não erraram nenhuma cobrança nos pênaltis. D’Alessandro e Heinze perderam pelo lado argentino, sacramentando o título. Em um dos maiores duelos da história do clássico, o Brasil levava a melhor, e um império breve, mas memorável, tinha início.

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