Uma necessária mudança de mentalidade no futebol brasileiro

Uma necessária mudança de mentalidade no futebol brasileiro

As categorias de base podem ser uma das soluções para a crise econômica dos clubes

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É mais do que clara a crise econômica que assola o futebol brasileiro há tempos. E há muito também se discutem métodos para amenizá-la. Difícil. Mas também é complicado traçar a origem da defasagem em relação a outros mercados.

Não tenho a ousadia de tentar explicar o porquê da crise e nem tentar traçar uma caça às bruxas e apontar para todas as feridas do futebol brasileiro. A ambição aqui é apenas trazer reflexões que podem tentar ajudar o futebol brasileiro e os clubes que definham sem dinheiro e com dívidas milionárias.

Uma das sugestões é a valorização das categorias de base pelos clubes brasileiros – principalmente os de maior poderio econômico. Além de ser uma importante fonte de renda com vendas de jogadores – tanto dos raros craques como dos medianos -, os promissores atletas podem enriquecer um elenco com salários muito abaixo de atletas “consagrados”.

Exemplos recentes não faltam. São Paulo e Corinthians, dois dos principais clubes brasileiros, caíram nas oitavas-de-final da atual edição da Copa Libertadores. Ambas as equipes tinham status de favoritas ao título do torneio. Além da qualidade de alguns atletas, as respectivas diretorias investiram muito em busca de um elenco qualificado.

Com folhas salariais que chegam perto dos R$ 10 milhões, o déficit anual e a dívida dos clubes só aumentam a cada negociação descabida. No Corinthians, os casos de Cristian e Emerson Sheik, com salários de R$ 500 mil, Edu Dracena, R$ 280 mil, Pato, R$ 800 mil (dividido com o São Paulo), são alguns exemplos. A remuneração mensal, insuflada pelo mercado desregulado, acaba acarretando em déficits. No ano passado, o clube de Parque São Jorge declarou mais de 90 milhões desfavoráveis.

Apesar do constante aumento das cotas de TV (principal fonte de receita da maioria dos clubes), contribuição cada vez maior dos programas de sócio torcedor e aumento gradativo dos valores pagos por patrocinadores (com exceção de alguns casos), a falta de venda de jogadores e os gastos exorbitantes acabam deixando a balança cada vez mais desfavorável.

Vale lembrar do custo que o Corinthians obteve após a construção da sua Arena, mas esse não é o maior dos problemas. É só ver o caso do rival São Paulo, que continua no Morumbi e também acumulou déficit na casa dos R$ 100 milhões. A receita para o insucesso financeiro foi parecido.

A folha salarial perto dos R$ 10 milhões mensais, agravada pela falta de patrocínio master, piorou a situação financeira de um clube que antes era modelo. Muitos dos salários altos, não justificados dentro de campo, já podem começar a ser diminuídos do elenco.

Os clubes já pensam em reformulação e “limpeza” na folha salarial. E por que não pensar nisto antes?

Uma das soluções seria o número mínimo estipulado de jogadores das categorias de base no elenco. Os dois clubes, por exemplo, tem muita fama por revelar ótimos jogadores. Além disso, costumam conquistar taças nestas categorias. Com metade do time formado em casa, muitos jogadores experientes – com altos salários, mas sem muito futebol – seriam barrados em detrimento dos pratas da casa.

Sendo assim, os clubes investiriam em “craques” para a equipe titular e o banco de reservas ficaria livre de medalhões. Seria uma mescla entre jovens e experientes na medida certa, sem perda de espaço para os jogadores formados no próprio clube. Com o passar do tempo, cada vez mais talentos surgiriam – aqueles que aparecem já com 18 anos, caso de Neymar no Santos, ou os que demoram mais para amadurecer, caso de Geuvânio, também do clube alvinegro.

Valdívia: da base para o sucesso no Inter (Foto: divulgação/internacional.com)
Valdívia: da base para o sucesso no Inter (Foto: divulgação/internacional.com)

Será que Reinaldo (São Paulo), Edílson (Corinthians), e tantos outros são melhores que atletas formados no próprio clube, já ambientados e que ganham muito menos?

O Internacional é um caso a ser “imitado”. Após muito tempo investindo milhões em reforços “galácticos”, o time desta temporada tem sete jogadores formados no próprio clube, inclusive o destaque do time, o meio-campista Valdívia. Porém, o forte Colorado também erra. Anderson, contratado a peso de ouro no início do ano, amarga a reserva para o jovem Rodrigo Dourado.

Sem extremismo e com muito equilíbrio, é possível montar uma equipe coesa. Dificilmente um time formado só por jovens conquistará um título – salvo belas exceções – mas a mescla pode ser potencialmente vitoriosa, além de auxiliar no importante equilíbrio financeiro do clube.

O futebol holandês, ciente das suas limitações econômicas, utiliza muito os recursos caseiros. Lá a prospecção de jovens atletas e jogadores bons e baratos também é um triunfo. Ajax e PSV já entenderam e interpretaram o mercado. A fórmula é de sucesso e pode ser seguida por muitos clubes.

Esperamos que isso não seja feito só após uma eliminação, naquele fatídico dia seguinte do “caça às bruxas” e da “reformulação”. O futebol é, cada vez mais, um jogo que requer sabedoria e planejamento. Talento nas categorias de base o Brasil (ainda) tem.

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