O ato de aposentar uma camisa é carregado de bastante simbolismo. Significa, acima de tudo, reconhecer a importância de um jogador para o clube e demonstrar-lhe eterna gratidão. Trata-se, portanto, de uma honraria destinada a poucos. E neste seleto grupo de lendas certamente está Javier Zanetti, também conhecido como “Il Capitano”.
Ao longo de sua carreira, o polivalente defensor chegou a mudar de posição e atuar como zagueiro, lateral-direito e volante. Algumas características, entretanto, permaneceram inalteradas com o passar dos anos, como a liderança natural, o corte de cabelo e, claro, o número 4 estampado em seu impecável uniforme azul e negro da Internazionale-ITA.
A história do argentino no time italiano começou na temporada de 1995, quando ele foi contratado junto ao Banfield-ARG, aos 21 anos de idade. Fez sua apresentação formal no emblemático edifício Terrazza Martini, em Milão, num 5 de junho chuvoso, mas acabou ofuscado na cerimônia devido à presença do compatriota Sebastián Rambert, talentoso atacante que havia se destacado no Independiente-ARG.
Talvez nenhum dirigente naquela sala tenha imaginado que a grande decepção desses reforços seria justo Rambert, enquanto o tímido e jovem Zanetti, por outro lado, assumiria, tempos depois, o papel de protagonista. Na realidade, poucos estrangeiros tiveram tamanha identificação com um clube. E os números do defensor retratam perfeitamente o profundo vínculo dele com a Inter.
Em 27 de agosto do mesmo ano em que chegou à Itália, o jogador estreou na vitória por 1 a 0 diante do Vicenza Calcio. Desde então, construiu um currículo de dar inveja. Ao despedir-se dos gramados em 18 de maio de 2014, na derrota para o Chievo Verona por 2 a 1, o defensor totalizava 19 temporadas defendendo uma única equipe, da qual era capitão desde 29 de agosto de 1999.
Na atualidade, ele é o estrangeiro com mais partidas no Calcio (618, atrás apenas de Paolo Maldini, que tem 647) e o atleta que mais vezes vestiu a camisa da Internazionale (858)*. Ganhou 5 taças do Campeonato Italiano, 4 da Copa Itália, 4 da Supercopa da Itália, 1 da Copa da UEFA, 1 da Liga dos Campeões da Europa e 1 do Mundial de Clubes.
Na noite desta segunda-feira (4), no Estádio Giuseppe Meazza, sua casa de sempre, Zanetti organizou um amistoso beneficente com craques do passado. Presidente da Fundação Pupi, dedicada à luta pelos direitos das crianças e adolescentes, o ex-zagueiro viu sua equipe perder por 6 a 4 para o time que representou a Expo Milão 2015.
Além dos objetivos filantrópicos, o evento também serviu para aposentar oficialmente a camisa 4 tanto usada pelo argentino. Seu nome é quase sinônimo do clube. O menino que deu seus primeiros passos nas categorias de base do Independiente virou ídolo. O ídolo, mais tarde, converteu-se em mito. O mito, agora, transformou-se em lenda.
No futebol italiano, o Milan já aposentou o 3 de Paolo Maldini e o 6 de Franco Baresi, ao passo que o Cagliari não estampa mais o 11 de Gigi Ravia em seus uniformes. O Napoli retirou a 10 de Diego Maradona, mesmo número que o Brescia deixou de usar em homenagem a Roberto Baggio. Hoje, merecidamente, Zanetti se torna o mais novo membro desse notável conjunto.
Na seleção da Argentina, em contraposição, ele não teve o mesmo reconhecimento. Embora seja o jogador que mais vezes entrou em campo com a camisa alviceleste (145), foi preterido pelos técnicos José Pekerman e Diego Maradona para a disputa das Copas do Mundo de 2006, na Alemanha, e de 2010, na África do Sul, respectivamente.
Já em Milão, como se não bastasse a idolatria, Il Capitano foi nomeado vice-presidente da Inter até 2016, logo após pendurar as chuteiras, aos 40 anos de idade. A indicação partiu do magnata indonésio Erick Thohir, atual proprietário do clube. Mas esta é apenas outra forma carinhosa de agradecer por quase uma vida de dedicação.
Grazie, Zanetti!
