“Será que não quiseram falar sobre o Biro Biro e erraram a digitação?” – Essa pode ser a primeira impressão de algum leitor desavisado ao ler o título acima. Mas não, o personagem deste texto não é o ídolo corintiano citado nessa pergunta hipotética, e não é semelhante a ele em nada a não ser pelo nome. OK, talvez o carisma.
De fato, Biri Biri não parece ser uma alcunha muito imponente e dificilmente este nome será lembrado em alguma discussão sobre futebol. Mas foi assim que ficou conhecido o gambiano Alhaji Momodo Njle, que em 1970, com 22 anos de idade, saiu de seu país para fazer história.
Biri Biri não era exatamente um craque. Jogava aberto no campo de ataque e tentava se impôr frente aos adversários aproveitando o porte físico, avantajado em relação a outros ponteiros da época e suficiente para bater de frente com os defensores oponentes.
Seu forte era o improviso. Parecia atrair forças boas dentro de campo, de modo que na Gâmbia os amantes do futebol chegavam a acreditar que fosse algum tipo de feiticeiro. Bolas que pareciam ir pra fora acabavam entrando, quicadas se transformavam em domínios eficientes.
Essa combinação de força física, ações do acaso e um pouco de técnica já era suficiente para fazer com que Biri Biri fosse tranquilamente o melhor jogador do país na época, ainda mais considerando-se a baixíssima qualidade da concorrência.
Não era comum observar talentos africanos naquele período. Foi por isso que quando o gambiano apareceu no Derby County, em 1970, ninguém entendeu muito bem o que estava acontecendo. Aparentemente, algum olheiro inglês havia observado suas boas apresentações pelo Augustinians, da Gâmbia.
O talento do ponta não foi lá muito apreciado pelo lendário Brian Clough, comandante do Derby County à época. Depois de um período de testes, o técnico definiu que Biri Biri não estava pronto para enfrentar a competitividade do futebol britânico, o que provocou a decepção e a volta do jogador para a Gâmbia.
Mas a sorte voltaria a brilhar para o atleta. Dois anos depois, os dinamarqueses do B 1901 excursionaram pela África e fizeram uma parada na Gâmbia, onde jogaram um amistoso contra o Wallidan Banjul, time de Biri Biri. Apesar da derrota por 5×4, o astro marcou 3 gols, suficientes para ganhar uma chance no time dinamarquês.
Assim, ele se tornava o primeiro africano a jogar na liga dinamarquesa, que na época era semi-profissional. O salário não era lá grande coisa, e para complementar a renda o jogador trabalhava meio-período lavando roupas em um hospital de Nykobing.
A temporada em campo foi boa. Biri Biri foi um dos destaques da equipe que chegou à final da Copa da Dinamarca, perdendo por 2×0 para o Randers Freja na decisão. Seu estilo de jogo e o teor “exótico” para os dinamarqueses acabaram o tornando um dos favoritos da torcida.
Mas aquela final seria a última aparição do gambiano pelo clube. Logo após o jogo, dirigentes do Bétis o colocaram em um avião com destino a Sevilha, para assinar com o clube. Mais uma vez, o acaso entraria em cena.
O avião também tinha em sua tripulação dirigentes do Sevilla, que ao ouvirem sobre a negociação resolveram passar a perna no rival. Não acompanhavam a carreira do atleta, mas acharam que cairia bem com a torcida a história do “chapéu”. E foi assim que aconteceu.
Em 1973, Biri Biri começou sua trajetória na Espanha. na primeira temporada pelo Sevilla, sob o comando do austríaco Ernst Happel, seu desempenho não foi digno de nota. Com a saída do treinador, o futebol do ponta começou a florescer e chamar a atenção dos fanáticos que ocupavam as arquibancadas do estádio Ramon Sanchez Pizjuan.
Na temporada 1974-75, o time conseguiu o acesso para a primeira divisão espanhola, e Biri Biri caiu nas graças dos torcedores de vez, com 14 gols na campanha. Passou a ter alguns privilégios, como viagens “esticadas” para matar a saudade da família na Gâmbia.
Com o status de ídolo, recebeu uma homenagem digna de grandes craques: um grupo de torcedores criou o setor “Biris Norte” no estádio em homenagem ao astro, abrigando a parte mais efervescente da torcida do Sevilla.
Foi assim, na base do futebol e do carisma, que o gambiano passou cinco temporadas no clube espanhol. Mas as saudades estavam batendo forte. Em 1978, voltou para a Dinamarca, atuando pelo Herfolge Boldklub, onde conquistou mais um acesso. E em 1981 retornou para o Wallidan, em sua terra natal, onde encerraria a carreira cinco anos depois.
Biri Biri é reconhecido até hoje como o maior jogador da história do país, mesmo não sendo especialmente dotado de técnica. Seu legado, no entanto, acabou sendo maior que qualquer questionamento. Uma prova que o acaso funciona para quem sabe aproveitar as oportunidades.