As emoções de uma noite no meio da fanática torcida argentina

As emoções de uma noite no meio da fanática torcida argentina

Equipe do Alambrado acompanhou da arquibancada a derrota do Belgrano por 2 a 1 diante do River Plate

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Vos sos el famoso River, el famoso River Plate, no te olvides que una tarde te mandamos a la B”, cantava em uníssono a torcida do Belgrano, na noite deste domingo (1º), no Estádio Mario Alberto Kempes, em referência ao primeiro rebaixamento da história do River Plate, ocorrido em 2011.

A provocação dos “Piratas” de Córdoba nas arquibancadas começou um pouco antes da partida, quando os atletas do time da capital entraram em campo para realizar os trabalhos de aquecimento. Estes visavam o resultado positivo pela terceira rodada do Campeonato Argentino para se recuperar do empate da semana anterior.

Outro fato é que os jogos entre ambos não são iguais desde 2011, quando o River vivia má fase e ficou no 9º lugar do Torneo Clausura, porém em 17º na lista de “promedios”, sistema que leva em conta a pontuação média obtida nas últimas três temporadas.

Assim, os Millonarios precisaram disputar a “promoção” diante do quarto colocado da Série B Nacional. Primeiro, viajaram a Córdoba para atuar no Estádio El Gigante de Alberdi. Depois, decidiram sua permanência na elite em Buenos Aires, no Monumental de Núñez.

Na ida, o Belgrano havia ganhado por 2 a 0. Na volta, o River abriu vantagem de 1 a 0 e sonhava com o empate no placar agregado. No entanto, as esperanças foram enterradas aos 16 minutos do segundo tempo, após falha da zaga: Farré marcou para os Piratas.

 

 

O chute do meia, de certa maneira, esteve presente no pensamento dos cerca de 40 mil torcedores locais. Vale lembrar que a presença de visitantes está proibida pela AFA desde junho de 2013 como medida, meio simplista, para tentar coibir a violência no futebol.

Assim, o recebimento para a equipe mandante foi caloroso, com papel picado e bandeiras tremulando por todos os lados. A Barra Brava Los Piratas Celestes de Alberdi, que sempre situa-se atrás do gol, inclusive, exibiu três bandeirões. A noite era de festa.

Em campo, o barulho parecia não surtir tanto efeito nos jogadores. Defensivo, o Belgrano tentava conter os ataques do River Plate e colocar-se na dianteira por meio de contra-ataques. Contudo, nenhum dos times conseguiu alterar o placar antes do intervalo.

Na etapa final, Rodrigo Mora quebrou um longo jejum (não balançava as redes desde novembro) e marcou duas vezes para o River, aos 32 e aos 36. Aos 42, Escudero aproveitou rebote na área após cobrança de escanteio e descontou para os anfitriões.

O tento proporcionou alento ao torcedor e sobrevida ao Belgrano, que teria mais três minutos de acréscimo. Até houve pressão, porém os Millonarios administraram a diferença. Mesmo com o revés, o time da casa foi exaltado por seu fiel público.

 

Torcida do Belgrano no Estádio Mario Kempes (Foto: Marcos Gaspar / Alambrado)
Torcida do Belgrano compareceu em peso no Estádio Mario Kempes (Foto: Marcos Gaspar / Alambrado)

 

O olhar dos fãs, por outro lado, não escondia a decepção de ver a derrota daquele que teve chances de vencer. A única equipe de Córdoba na elite do futebol argentino não pôde parar a potência da capital do país na luta que sempre lembrará David e Golias.

Cada tento de Mora fez com que os sons produzidos na acústica do Mario Kempes ficassem mais baixos e golpeou o torcedor que estava de pé sobre as cadeiras durante os 90 minutos, forçando-o a baixar levemente a cabeça por um instante.

E creio que cada gol do atacante uruguaio – “logo o uruguaio”, lamentou-se um fanático patriota – foi além de uma simples ferida ocasionada pelo insucesso de uma rodada noturna, às vésperas do início de uma semana laboral.

Meu argumento é o garotinho que avistei no meio da multidão celeste, aparentando possuir três anos de idade, uniformizado com as cores do Belgrano, segurando a mão daquele que deve ser seu pai, com os olhos vermelhos de tanto chorar.

A cena me marcou bastante. Não bastasse retratar a paixão dos argentinos pelo futebol, aquele olhar perdido no horizonte, inconsolável, mostrava que a criança, tão cedo, talvez sem entender direito, já sofre da doença para a qual muitos desistiram de buscar a cura.

É bem provável que o menino nem se lembre do ocorrido. Ou que o cachorro bege que andava pelos espaços entre as cadeiras amarelas, brancas e verdes como se estivesse em território familiar lhe tenha sido muito mais interessante que o duelo.

Ou também é possível que o garoto, daqui a um tempo, só se recorde do homem que, durante o intervalo, chutava para a plateia bolas distribuídas por patrocinadores  – furando um chute, inclusive, para delírio e provocação da torcida.

Mas naquele momento infinito e breve, no olhar penetrante da criança, vi a síntese de uma partida tão aguardada: o torcedor que esperou a semana inteira para dormir com um sorriso no rosto e foi embora experimentando a amargura da derrota.

Não importa. Como consolo, pelo menos, os Piratas sempre poderão lembrar-se do dia 26 de junho de 2011, quando uma atrevida equipe do interior ousou desafiar a ordem vigente e, como visitante, decretou a queda de um gigante para a “B”.

 

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