Com a popularização do fenômeno “terceiro uniforme”, é cada vez mais usual a aparição de tonalidades que diferem das clássicas nos mantos de futebol, exigindo rara destreza dos departamentos de marketing para explicar a escolha da nova cor – todas sempre inéditas, claro, para mitigar a infindável ânsia consumista desse mundo.
Mas os times nem sempre adotam vestimentas alternativas por razões financeiras. Um bom exemplo disso é o Alianza Lima, que costuma trocar o azul de sua camisa principal pelo roxo. A prática tem cunho religioso e surgiu no dia 3 de outubro de 1971, quando os aliancistas venceram o Sporting Cristal por 2 a 0, no Estádio Nacional, em Lima.
Graças ao resultado, a tradição foi mantida, sempre no mesmo período do ano. Segundo a imprensa à época, a cor do uniforme dos jogadores comandados pelo técnico brasileiro José Gomes Nogueira surpreendeu o público, indicando que ela não havia sido usada antes da referida data, e, portanto, desmentindo outras versões.
Uma das histórias que ganhou força ao longo dos anos foi a de que, em 1955, o Alianza Lima estava em débito com sua fornecedora de material esportivo, motivo pelo qual não poderia comprar pano azul para o jogo contra o Sporting Tabaco, em 25 de setembro.
Então, o roupeiro José Carrión, devoto de Jesus Cristo (lá conhecido como Senhor dos Milagres) que prestou serviços ao clube por quase cinco décadas, teria mandado camisas roxas de sua congregação à empresa para esta produzir a nova vestimenta.
Ao notar no dia da partida a mudança repentina, o dirigente Alfonso de Souza Ferreyra Basagoitia teria se revoltado e demitido Carrión.
A vitória, contudo, animou o futuro presidente honorário da agremiação, que teria voltado atrás e incentivado o roupeiro.
Assim, no jogo seguinte, contra o Deportivo Municipal, em 2 de outubro, a camiseta seria adequada ao modelo original de listras, com o roxo no lugar do azul. O êxito por 1 a 0 teria selado definitivamente a tradição. Os dados estão corretos, mas há imprecisões.
O portal peruano De Chalaca resgatou fotos em preto e branco do primeiro encontro, e nelas o Alianza Lima não estava com a camisa totalmente roxa, e sim uma com três faixas verticais escuras e duas claras, sinalizando o uso do uniforme tradicional.
Em relação ao segundo jogo, apesar de as imagens não serem coloridas, é possível notar que a tonalidade não corresponde ao roxo, e a ausência de registros escritos sobre uma mudança tão significativa também reforça que a equipe jogava de azul até 1971.
Afinal, qual é o motivo para a troca de cores promovidas pelo Alianza Lima? Simples. O clube é devoto dos Senhor dos Milagres, que no Peru é historicamente associado ao roxo, segundo a lenda, devido a um grupo de nazarenas que trajava essa cor.
Já o mês de outubro é referente ao maremoto que devastou as cidades de Callao e Lima em 1687 e derrubou uma capela edificada em homenagem a Jesus. Só a parede onde havia uma imagem de Cristo continuou em pé, dando início aos rituais de devoção.
Como Carrión e Ferreyra faleceram há tempos, não podemos, obviamente, confirmar das fontes o surgimento dessa prática. Mas o fato é que ela entrou para a história e, até onde se sabe, é o único exemplo de um clube que muda sua cor por motivos religiosos.