Portugal, Angola e o amistoso “da paz” que virou batalha

Portugal, Angola e o amistoso “da paz” que virou batalha

Jogo em 2001 começou em clima de fraternidade e terminou antes dos 90 minutos

COMPARTILHAR
Base da seleção angolana na Copa de 2006 disputou o lendário amistoso no Alvalade (Foto: Reprodução)
Base da seleção angolana na Copa de 2006 disputou o lendário amistoso no Alvalade (Foto: Reprodução)

Sempre houve uma ligação forte entre Portugal e Angola. Os angolanos só conseguiram se libertar do domínio português em 1975, e mesmo assim mantiveram traços fortes da cultura lusitana em seu país. Seria curioso, portanto, pensar o que aconteceria em um duelo entre os dois países dentro de um campo de futebol. A resposta veio em 2001, e “duelo” chega a ser uma descrição amena para o que aconteceu naquele 14 de novembro no Estádio José Alvalade.

No início, tirando o contexto histórico, pouco indicava o que estaria por vir. O clima era de confraternização entre as duas torcidas para o amistoso em Lisboa, com os fãs angolanos cantando em alto volume seu hino e até mesmo se juntando aos portugueses para cantar o hino de Portugal.

A seleção portuguesa havia acabado de garantir sua classificação para a Copa do Mundo de 2002, a primeira participação do país em Mundiais desde 1986. Angola não teve a mesma sorte, mas contava com um geração forte para os padrões do país, ao ponto de finalmente estrear em Copas em 2006.

Logo no início da partida, os angolanos fizeram questão de mostrar essa força. Com menos de um minuto, Mantorras cruzou e Mendonça emendou de primeira, marcando um belo gol. A abertura do placar fez explodir a festa africana no estádio, e causou surpresa nos portugueses.

Mas nada comparado ao choque que estava a caminho. Aparentemente com mais vontade do que o aceitável para uma partida amistosa, o lateral Yamba Asha deu uma entrada dura em Pauleta aos 13 minutos. Ele recebeu o cartão amarelo pelo lance, mas isso não serviu como aviso. Três minutos depois, em outra falta duríssima, dessa vez sobre o craque Figo, Asha acabou expulso pelo francês Pascal Garibian.

Os jogadores portugueses foram pra cima, chocados com o grau das divididas e o risco de lesões que poderiam tirar as estrelas do time da Copa do Mundo. E os atletas de Angola ficaram mais bravos ainda, acreditando que o juiz havia exagerado na interpretação dos lances e que a expulsão havia sido injusta.

Aos 24 minutos, Pauleta invadiu a área e foi derrubado por Franklim Manuel. O juiz marcou pênalti e expulsou o angolano. Revoltado com a punição ao colega, o zagueiro Estrela Wilson reclamou tanto que tomou dois cartões amarelos nesse meio-tempo, fazendo companhia a Manuel e Asha. Figo bateu o pênalti e empatou o jogo.

Em poucos minutos, Angola saiu de um placar histórico para um empate e uma desvantagem numérica de três jogadores. Para piorar a situação, Nuno Gomes e jorge Andrade balançaram as redes antes do primeiro tempo acabar. O prognóstico não era bom para as Palancas Negras.

No intervalo, o técnico Mario Calado fez uma substituição, e até os seis minutos do segundo tempo mexeu no time outras seis vezes, aproximando-se do limite de oito alterações permitidas para o amistoso. Enquanto isso, Luis Boa Morte havia aumentado o placar para 4×1.

Nesse ponto, parecia claro que a estratégia de Angola seria acabar com a partida o mais rápido possível, não importava o custo. Jogadores experientes, como o meio-campista Akwa, desafiavam todas as marcações do árbitro e continuavam fazendo faltas duras. Aos 16 minutos, os angolanos fizeram sua última substituição, e três minutos depois Antonio Neto foi expulso, deixando o time com apenas sete jogadores.

Portugal marcou o quinto gol logo na sequência, com Nuno Gomes. Era a deixa para acabar com o jogo de vez. A pedido do técnico Mario Calado, o defensor Helder Vicente desabou em campo logo depois do gol. Como agora o time não tinha mais nenhuma substituição disponível e exige-se um mínimo de sete jogadores para continuar a partida, o árbitro francês decretou o fim do jogo, com apenas 25 minutos do segundo tempo.

Humilhados pelo o que haviam visto, os torcedores de Angola resolveram protestar arrancando cadeiras do José Alvalade. Um foguetório que estava previsto para depois da partida para celebrar a união histórica entre os dois países acabou cancelado.

Cinco anos depois, Portugal e Angola voltariam a se encontrar, dessa vez no maior cenário do futebol, a Copa do Mundo. Em um clima muito menos violento, os portugueses levaram a melhor mais uma vez, dessa vez apenas por 1×0. Nada que lembrasse aquela noite maluca em Lisboa.

Deixe seu comentário!

comentários