Muito mais que um jogo – Como o futebol combateu o apartheid

    Muito mais que um jogo – Como o futebol combateu o apartheid

    Filme "More than just a game" conta a história do futebol na vida dos presos políticos de Robben Island

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    O time dos presos políticos retratado em "More than just a game" (Foto: Divulgação)
    O time dos presos políticos retratado em “More than just a game” (Foto: Divulgação)

    Existem pouquíssimas opções de recreação quando um ser humano é privado de sua liberdade. Em uma situação assim, as raras oportunidades de diversão acabam se tornando também ferramentas de expressão e até mesmo mostras de resistência.

    Um bom exemplo disso é a situação dos presos políticos sul-africanos durante a época do apartheid. Mantidos em cativeiro na prisão de Robben Island, viam-se não apenas trancafiados, mas com o espírito se desfazendo pouco a pouco ao se encontrarem sem chances de sequer exercer uma atividade de diversão em grupo. E a salvação acabou sendo o futebol.

    A história é contada no filme “More than just a game”, um semi-documentário produzido em 2007. A obra mostra como os presos de Robben Island conseguiram convencer seus encarceradores a liberarem a prática do futebol durante o tempo livre. Como um dos poucos livros disponíveis era o Manual de Regras da FIFA, a ideia era organizar uma liga que seguisse todos os padrões oficiais.

    Foi assim que surgiu em 1967 a Makana Football Association. As equipes eram formadas prioritariamente com base na corrente ideológica de cada prisioneiro. Mesmo que todos ali tivessem feito algo contra o regime, haviam discordâncias quanto aos rumos políticos e às formas de ação.

    Discordâncias políticas à parte, organizaram-se nove equipes, divididas em três divisões. Os jogos contavam com arbitragem e registros em súmulas, tudo como mandava o manual. Os times tinham técnicos e assistentes, e havia até mesmo uma espécie de tribunal para julgar reclamações de quem se julgava prejudicado pela arbitragem.

    Um dos juízes era Jacob Zuma, que anos depois de ser solto da prisão se tornaria presidente da África do Sul. Zuma, que também atuava como zagueiro nos jogos da liga, tinha a companhia de outras figuras políticas importantes do país no pós-apartheid, como o futuro Ministro da Defesa Mosiuoa Lekota, e Kgalema Motlanthe, que chegou a assumir como presidente interino.

    No entanto, o destaque ficava fora das quatro linhas. De longe, no alto de uma das torres, isolado do restante dos presos justamente por conta de sua capacidade de inspirá-los, Nelson Mandela assistia os jogos da liga Makana e percebia que ali acontecia algo muito além de uma simples prática esportiva.

    Não era só um jogo, e sim a mostra que diversos pensamentos e correntes conseguia se unir em prol de algo. Por que não fazê-lo, então, pelo bem da África do Sul? Percebendo o apreço de Mandela pelas partidas, os guardas de Robben Island mandaram subir um muro que impedisse  sua visão do campo.

    O “estrago” já estava feito. Os presos já tinham usado o futebol para restaurar seus espíritos, a confiança, e principalmente o senso de participação coletiva. Fatores que se tornariam essenciais quando o regime caiu e Mandela assumiu a presidência, em 1994. Em 2007, a Makana Football Association recebeu o reconhecimento honorário por parte da FIFA.

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