No início deste ano, Francesco Totti caminhou por uma estrada que parecia estar a uma distância olímpica de seu glorioso horizonte. Insatisfeito com a frequente presença no banco de reservas, o ídolo da Roma entrou em atrito com o técnico Luciano Spalletti e chegou a ser afastado da equipe principal. O motivo foi uma declaração à imprensa feita pelo jogador em que ele exigia mais respeito por sua história no clube italiano.
Hoje com 39 anos, “Il Capitano” sofreu lesões que o atrapalhavam desde a última temporada e também perdeu espaço devido à contratação de reforços como Dzeko, Salah e, mais recentemente, El Shaarawy. Outro motivo que pesou para sua condição de suplente é o relacionamento protocolar com Spalletti, com quem já havia se desentendido em 2009, quando o treinador deixou o cargo um ano após o último título romanista.
As feridas entre ambos foram expostas com a eliminação para o Real Madrid nas oitavas de final da Liga dos Campeões, em fevereiro. Na ocasião, o camisa 10 só entrou em campo aos 42 minutos do segundo tempo na derrota por 2 a 0, na Itália, apesar de ter garantido que estava bem fisicamente. Depois das críticas, ele nem chegou a ser relacionado para o jogo contra o Palermo, tendo de ver das arquibancadas à goleada por 5 a 0.
No Estádio Olímpico, Totti foi aplaudido pelos torcedores, enquanto a Spalletti foram direcionadas inúmeras vaias, em que pese o triunfo fundamental para manter a equipe na briga com o Napoli pela vice-liderança e a vaga direta na próxima edição do torneio continental. Entre polêmicas e incertezas, especulou-se até mesmo que o Capitano pudesse – imaginem só! – trocar a única camisa que defendeu na vida por uma da MLS.
Mas a história de Totti não poderia acabar de forma melancólica. Não deveria. E, por enquanto, ainda não acabou. Mesmo com raras aparições no time titular e falta de ritmo, ele aproveitou as últimas semanas para mostrar o potencial de seu futebol e talvez dar um novo fôlego à sua permanência na Roma, já que seu contrato acaba ao fim da temporada.
Nos cinco jogos mais recentes, ele entrou em campo com a bola rolando (sempre na etapa final) e conseguiu anotar quatro gols, além de ter distribuído uma assistência para Salah buscar o empate caseiro com o Bologna (1-1). Diante do Atalanta, teve papel fundamental e fez o tento que garantiu a igualdade (3-3) como visitante.
Já contra o Torino, a façanha mais destacada e que ganhou repercussão mundial. Entrou aos 41 do segundo tempo e balançou a rede adversária duas vezes, assegurando a virada no Olímpico (3-2). Na primeira oportunidade, esticou-se todo para desviar a bola após cruzamento. Na segunda, cobrou pênalti rasteiro e forte no canto, sem chance para o goleiro, o que levou fãs e narradores ao completo delírio.
Na passada segunda-feira (2), Totti voltou a ser notícia. Atuando no Stadio Luigi Ferraris, acertou um petardo de fora da área e igualou o encontro contra o Genoa (2-2), que terminaria com vitória romanista graças a um gol no fim de El Shaarawy. Definitivamente, a estrela do Capitano ainda brilha e oferece alento ao torcedor que o idolatra e defende. A nós, resta apreciá-lo enquanto ele ainda está em atividade.
As performances já mencionadas devem convencer a diretoria a lhe oferecer um novo contrato, mesmo que para isso ele precise abrir mão de parte de seu salário.
Um sacrifício não muito difícil, imagino, mas que certamente engrandecerá ainda mais sua fidelidade no mundo do futebol, algo cada vez mais raro.
Perto de completar quatro décadas de vida, quase toda ela dedicada à Roma (profissionalmente são 23 anos), Totti é um símbolo, um patrimônio do clube, e deve ser tratado assim. Embora esteja longe de sua forma ideal e encontre dificuldades, muito em função da idade avançada, ele não pode ser simplesmente dispensado. Seria uma heresia!
Sua visão dentro de campo, sua experiência e sua lenda são referências importantes para quem é rodado e para os jogadores recém-promovidos à equipe principal. Mais do que o segundo maior artilheiro da Serie A, ele é também um torcedor que defende as cores do clube em campo, um homem que sente e vive a Roma. Por tudo isso, merece um final digno.
Contudo, esperamos que essa jornada do herói demore um pouco mais para ser concluída. Enquanto isso, como já foi dito, apenas desfrutamos dessa inspiradora narrativa interminável de amor.