Há muito tempo, futebol e superstição caminham lado a lado. Talvez desde que a bola é redonda. A manifestação do referido vínculo místico pode ser observada em diversas partes do mundo e se dá por meio de atitudes corriqueiras, como a entrada no campo, o uso de um amuleto e outras particularidades mais íntimas de jogadores e técnicos.
No Brasil, em especial, um país caracterizado pelo amplo sincretismo de crenças, não faltam exemplos, como na Copa do Mundo de 1962, disputada no Chile. Na condição de defensor do título, o escrete canarinho protagonizou uma estreia bem-sucedida, em Viña del Mar, pelo terceiro grupo, e venceu o México por 2 a 0, com gols de Zagallo e Pelé.
Na época, o chefe da delegação brasileira, Paulo Machado de Carvalho, trajava o mesmo terno marrom que lhe havia servido de amuleto durante a exitosa campanha no Mundial da Suécia, quatro anos antes. Depois do triunfo sobre a seleção “azteca”, em 30 de maio, o ritual de se vestir com as mesmas roupas daquele dia se espalhou, e até a imprensa foi obrigada pelo Marechal da Vitória a fazê-lo, sob o risco de não poder cobrir a equipe.
A estratégia incomum deu certo, pois, coincidentemente, o Brasil faturou o bicampeonato naquele ano. Não significa, óbvio, que os fatos tenham relação entre si. Mas para ganhar um título vale (quase) tudo. Até mesmo se render a práticas desprovidas de sentido. Quando se vive um longo jejum de títulos, então, qualquer hábito deve ser preservado para que o time saia da fila e celebre a tão esperada e adiada volta olímpica.
É o caso de Lionel Messi na Argentina. Agora barbudo, o camisa 10 da “albiceleste” não adotou o novo visual por um pedido de sua mulher, Antonella Roccuzzo, nem se inspirou em Nicolás Otamendi, seu colega de seleção. Entre o fim da temporada, as audiências na justiça e as viagens, ele deixou os pelos faciais crescerem. Quando chegou aos Estados Unidos para a Copa América Centenário, foi “obrigado” a mantê-los.
Depois da vitória por 2 a 1 na estreia diante do Chile, algoz dos hermanos no ano passado, os colegas de Messi lhe pediram que não tirasse a barba, ainda que ele não tenha participado do jogo por estar recuperando-se de lesão nas costas. Com a goleada por 5 a 0 sobre o Panamá, quatro dias depois, na qual a Pulga saiu do banco para fazer três gols em menos de 45 minutos, o pedido virou uma espécia de ordem.
“Sigo levando a barba porque meus companheiros me pediram. Não se toca até o fim do torneio. Se eu a tirar, me matam”, revelou o craque, entre risos, durante entrevista depois do jogo. Para ser finalmente campeão, o elenco argentino está atento a todos os detalhes, inclusive à barba de Messi. Um pouco do mito de Sansão. Mas esse é apenas mais um breve capítulo na longa história envolvendo futebol e superstição.
Até aqui, a “tática” deu resultados. A Argentina foi a única seleção que se classificou para as quartas de final com 100% de aproveitamento e, além disso, viu rivais como Brasil, Paraguai e Uruguai caírem na fase de grupos. No próximo sábado (18), os homens orientados por Gerardo Martino medem forças com a Venezuela. Resta saber se com a nova aparência Messi vai enfim levantar uma taça por seu país e levar glória a seu povo.
Em todo caso, as superstições só são lembradas quando se vence. Nas outras vezes, soam como práticas infundadas, embora tenham inegavelmente seu valor e importância culturais.